As
denúncias contra empreiteiras na Operação Lava-Jato e a admissão, pela empresa
SBM, de pagamento de propina a funcionários da Petrobras, criaram um clima de
apreensão sobre o futuro da indústria da construção naval e offshore no Brasil.
Há receio dos eventuais efeitos das investigações sobre os estaleiros
nacionais, controlados em alguns casos pelas empresas envolvidas na Lava-Jato.
Sindicatos de metalúrgicos temem demissões em instalações industriais do setor,
que poderiam ficar impedidas de participar de novas licitações da Petrobras. E
há ainda, no meio empresarial, a avaliação de que a estatal, cliente única dos
grandes estaleiros, pode ter dificuldades de executar o seu plano de
investimentos, o que levaria a atrasos em novas encomendas.
A
construção naval é uma indústria recente no Brasil que requer investimentos de
longo prazo e renovação da carteira de encomendas para se consolidar. Por outra
parte, a Petrobras tem o desafio de cumprir sua meta de produção até 2020 e,
pelas regras do conteúdo local, precisa dos estaleiros nacionais para construir
novas plataformas, sondas de perfuração, entre outros equipamentos.
Em
meio aos escândalos da Lava-Jato e da SBM, surgem dúvidas sobre o futuro de
alguns estaleiros. Um deles é o Estaleiro Brasa, de Niterói (RJ), controlado
pela SBM em parceria com o grupo Synergy. Na segunda-feira, a presidente da
Petrobras, Graça Foster, afirmou que a SBM está impedida de participar de
licitações da Petrobras enquanto não esclarecer para quem pagou propina na
estatal. Graça disse que os contratos em andamento com a SBM não serão
interrompidos. No mercado, existem avaliações de que o Brasa, por ter a SBM
como sócia, poderá ficar sem novas obras da Petrobras. Procurada, a Petrobras
não se pronunciou.
O
estaleiro constrói módulos para plataformas e faz a integração desses módulos
no casco de navios-plataforma. Já entregou uma unidade e trabalha nos módulos
de outras duas plataformas, empregando hoje 1,6 mil trabalhadores, segundo
Edson Rocha da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Niterói. Ele
disse temer que ocorram demissões caso o Brasa fique impedido de entrar em
novas licitações da Petrobras. Procurados, os representantes do Brasa e da SBM
não foram localizados. Silva acrescentou que a UTC, envolvida na Lava-Jato,
também tem unidade em Niterói para a construção de módulos, onde emprega 850
trabalhadores.
"Não
queremos que se repita em Niterói o que está acontecendo em Charqueadas
[RS]", disse Silva. A afirmação é uma referência à paralisação da unidade
da Iesa Óleo e Gás, em Charqueadas, que pode levar à demissão de mil
trabalhadores. Na terça, a Petrobras rescindiu contrato para construção de
módulos de compressão de gás para plataformas de petróleo com a IESA. A IESA,
em recuperação judicial, é alvo da Lava-Jato e teve o presidente, Valdir
Carreiro, e o diretor Otto Garrido Sparenberg, presos na sexta-feira pela
Polícia Federal. Eles foram soltos na terça-feira.
A
Petrobras informou que uma nova licitação para a contratação dos módulos que
estavam com a IESA será realizada "oportunamente". A encomenda
original feita à Iesa em julho de 2012 era de 24 módulos para seis plataformas,
por US$ 720,4 milhões. Em outubro, porém, a construção de oito deles foi
transferida para a China em função da crise financeira enfrentada pela empresa
e pela controladora, a Inepar, que pediu recuperação judicial em setembro.
Ainda
no Rio Grande do Sul, a Estaleiros do Brasil (EBR), de São José do Norte, está
construindo módulos para a plataforma P-74 da Petrobras. A EBR é controlada
pela Toyo-Setal, que teve dois diretores incluídos na Lava-Jato, os quais
fizeram acordo de delação premiada. Fonte próxima da EBR disse que os contratos
que a empresa têm com a Petrobras, de construção de módulos, seguem
"normalmente". Mas a pergunta que o mercado faz é qual será o futuro
da EBR: se a empresa poderá sofrer os impactos dos atos dos controladores da
Toyo-Setal. Também há dúvidas sobre eventuais desdobramentos da Lava-Jato para
a Engevix Construções Oceânicas (Ecovix), do mesmo grupo da construtora
Engevix, cujo vice-presidente, Gerson Almada, está entre os presos da
Lava-Jato.
Um
dos delatores ligados à Toyo-Setal é o empresário Augusto Mendonça, que também
integra o conselho de administração da EBR. Mendonça foi eleito, na semana
passada, vice-presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e
Reparação Naval e Offshore (Sinaval) para o período 2014-2018. "O Sinaval
não pode cercear o direito de candidatura, em suas eleições, de representantes
de empresas legítimas do segmento industrial naval e offshore, os quais, pelas
leis brasileiras, devem ser considerados idôneos até prova em contrário",
disse nota do Sinaval divulgada após a eleição.
Na
Lava-Jato, foram presos executivos de empresas que controlam alguns dos novos
estaleiros do país. É o caso da Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, donas do
Estaleiro Atlântico Sul (EAS), de Pernambuco, em parceria com japoneses. OAS e
UTC também tiveram executivos presos. As duas empresas controlam, junto com
Odebrecht e Kawasaki, o estaleiro Enseada, da Bahia. Fonte disse que as
denúncias na Lava-Jato se referem à área de refino e, portanto, não guardam
relação com esses estaleiros. Outra fonte disse que o Enseada tem vida própria,
independente dos acionistas, e, este ano, deve faturar quase R$ 3 bilhões.
Fonte:
Jornal Valor Econômico